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Os raelianos e os empecilhos éticos para a clonagem humana

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Em 1973, Claude Vorilhon, um editor de uma revista especializada em esportes automobilísticos, alegou ter mantido contato com os Elohim (palavra hebraica que significa “Deus” ou “deuses”, conforme o Velho Testamento), mudou o nome para Rael e fundou a Religião Raeliana Internacional. Em outubro de 2000, Rael e seus seguidores geraram celeuma e perplexidade ao anunciarem que estavam prontos e dispostos a clonar seres humanos. Seria isso só uma forma de chamar a atenção ou teriam mesmo tal intenção? Se o que pretendem é colocar essa tecnologia a serviço de seus propósitos, ainda não muito bem esclarecidos e com os quais a sociedade pode não estar de acordo, então a polêmica é mais grave do que se pensa.
Parece inevitável que a ciência venha a clonar seres humanos no futuro, como já faz com os animais, mas para tanto se exige que obedeça a parâmetros e critérios éticos estrita-mente estabelecidos e que não favoreça ou beneficie uma elite privilegiada apenas. Destarte, nesse momento, em que pese a falta de um código de conduta, teme-se o desvirtuamento da prática, como já ocorreu no passado com outras descobertas.
Além disso, os geneticistas ainda não resolveram os problemas das altas taxas de ineficiência da técnica de fusão celular e dos defeitos congênitos apresentados pelos clones. Foram necessários nada menos que 277 embriões para que se obtivesse a ovelha Dolly, que ainda assim nasceu com uma estrutura celular ligada ao envelhecimento 20% menor que a de outras ovelhas da mesma idade. A diferença estava nas estruturas chamadas telômeros (compostos por pedaços de ADN – ácido desoxirribonucléico – e proteína na ponta dos cromossomos). Como o comprimento delas está ligado à duração da vida de uma célula, o risco é que os clones tenham vida mais curta.
O que põe a clonagem em cheque é se as anomalias genéticas decorrentes dela não estariam na raiz dos problemas de desenvolvimento embrionário e da alta mortalidade. O processo de reprogramação não é tão perfeito e a clonagem reprodutiva não é tão segura. Em suma, os clones produzidos com freqüência têm problemas severos o bastante – atrasos no desenvolvimento, defeitos cardíacos, problemas de pulmão e sistemas imunes (de defesa) defeituosos – para fazer refletir e rever os conceitos de quem quer que planeje clonar um ser humano. Animais podem ser sacrificados, mas o que fazer com seres humanos anormais? A simples tentativa de clonar pessoas com os conhecimentos de que dispomos hoje já não seria um crime?
As objeções às técnicas de clonagem não se restringem apenas ao aspecto reprodutivo. A clonagem terapêutica, destinada à produção de células-tronco – aquelas que podem dar origem a qualquer tipo de célula no organismo – a partir de embriões humanos pode ser vista com reservas mesmo por especialistas em reprodução humana. No entanto, esse tipo de experimento abre definitivamente espaço para a clonagem reprodutiva.
Através da empresa Clonaid Corp., domiciliada em Bahamas, um paraíso fiscal nas Antilhas, os raelianos dispõem o serviço de clonagem “a qualquer cidadão”, desde que desembolse uma módica quantia que varia de US$ 200 mil a US$ 500 mil. Fica uma pergunta: será que só uma elite de milionários tem (terá) o direito de perpetuar-se? É preciso lembrar que a clonagem de alguém que existe ou já existiu elimina um fator básico essencial que foi (e continua sendo) determinante para a extinção de várias espécies e para a sobrevivência da raça humana: a diversidade. A natureza é avessa à repetição, tanto que nunca gerou dois seres humanos exatamente iguais. Ocorre que quanto maior a variedade de uma espécie, maiores são suas chances de sobreviver e evoluir.
Um questionamento que se faz é se não seria perigoso o homem “brincar” de Deus. A história infelizmente tem mostrado que além de perigosíssimo, seria irresponsável e criminoso. Soa no mínimo ingênuo alguém achar que “o homem tem que brincar”, vide o que aconteceu ao homem quando imaturamente resolveu “brincar” com a energia atômica…
Valendo-se dos argumentos propostos na década de 1960 pelos autores da linha do “realismo fantástico” – tais como Charroux, Bergier, Pauwels, Kolosimo, Däniken, etc. –, afirmam os raelianos que os deuses do passado não eram seres divinos, e sim astronautas vindos de outros planetas. Ora, se estão imbuídos dessa concepção materialista, por que ou para que motivos sustentam uma religião que paradoxalmente se diz atéia? E se os objetivos são unicamente científicos, como garantem, por que ou para que motivos Rael faz questão de ser adulado/idolatrado como um profeta e guru?
O surgimento de religiões modernas como a raeliana é um fenômeno há décadas previsto por sociólogos e antropólogos preocupados com o tema. Os que cultuam os deuses astronautas acreditam que entidades extraterrestres desembarcaram na Terra em tempos primordiais e criaram a vida humana “à sua imagem e semelhança” mediante avançadas técnicas de engenharia genética e jamais deixaram de acompanhar sua evolução, manipulando-a sempre que necessário e, de tempos em tempos, enviando emissários ou mensageiros para guiar seus passos. A expectativa é a de que estejam prestes a intervir, logo que a história atinja determinado estágio ou patamar, trazendo a salvação a uns poucos escolhidos e instaurando uma nova ordem, utópica e ideal, longe das imperfeições atuais. Essa noção parece bastante espiritualista, mas no fundo é puramente materialista, pois os fiéis não esperam mais do que a aterrissagem de discos voadores repletos de extraordinários produtos tecnológicos dos quais possam usufruir os benefícios.
Os exageros de um autor como Däniken e sua fixação pela teoria dos deuses astronautas advém do equívoco primário de pretender ver e explicar o passado sob a ótica do presente, projetando valores e concepções. Como bem afirmou Lobo Câmara, em seu livro “A farsa da Nova Era: nem Apocalipse, nem Era de Aquário”, “acreditar na possibilidade de que já fomos visitados na Antigüidade por seres de outros planetas é uma coisa, mas tentar explicar tudo através dessa visão, como o fizeram Däniken e outros autores, é muito para a cabeça! É alimentar o gosto pelo fantástico até chegar ao ponto da alienação e da ignorância deliberada”.

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Cláudio Tsuyoshi Suenaga é mestre em História pela Faculdade de Ciências e Letras de Assis (FCLA), campus local da Universidade Estadual Paulista (Unesp), consultor da revista UFO e colaborador da revista Sexto Sentido.

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